O orçamento público no Brasil tem como uma de suas características o caráter autorizativo, assim, exceto em relação às despesas cuja realização é legalmente determinada, o Poder Executivo detém a discricionaridade de decidir se executa ou não despesas autorizadas nas leis orçamentárias.
Segundo James Giacomini (Orçamento Público, Editora Atlas, 2023), essa faculdade de o Poder Executivo executar ou não despesas autorizadas nas leis orçamentárias anuais aplicava-se também a todas as emendas parlamentares, configurando um "ponto sensível na relação entre os Poderes Legislativo e Executivo na temática do orçamento".
Insatisfeito, o Congresso Nacional formulou a PEC nº 22/2000, que previa que a programação constante da lei orçamentária anual seria de execução obrigatória, salvo excepcionalidade expressamente prevista. Direcionada somente às emendas individuais inseridas no orçamento, acabou promulgada em março de 2015 a EC nº 86 e posteriormente a EC nº 100 de 2019 que, dentre outros aspectos, estendeu a impositividade às emendas de iniciativa de bancada.
Outra atualização promovida em 2022, a EC nº 126, majorou de 1,2% para 2% o limite para participação de tais instrumentos, de execução obrigatória (impositiva).
Diante das mudanças na Constituição Federal ocorridas a partir de 2015, garantindo a execução orçamentária e financeira das emendas parlamentares individuais e de bancada em nível federal, diversos municípios incorporaram essas normas às suas leis orgânicas, imputando maior poder dos vereadores sobre recursos orçamentários locais.
Neste estágio, importante que o Poder Legislativo adeque a lei orgânica do município, obedecendo aos limites constitucionais, bem como que revise o regimento interno para estabelecer critérios, prazos e fluxos de tramitação claros, e que sejam elaboradas normas complementares ou manual orientativo que discipline todo o processo, nos termos do Comunicado SDG nº 28/2025 (TCESP).
A impositividade das emendas parlamentares em âmbito municipal reflete no notório comprometimento do orçamento público com despesas de caráter obrigatório e reforça a premissa de que o pouco disponível para gastos discricionários deve ter sua execução muito bem planejada, pautada por critérios técnicos, e não por interesses meramente eleitoreiros.
Ou seja, a tomada de decisão sobre o uso do escasso recurso disponível para o Poder Executivo municipal aplicar em políticas públicas prioritárias ou a ser compartilhada diretamente com o Poder Legislativo, agora também protagonista na execução do orçamento.
Nessa perspectiva, a decisão do Ministro do STF, Flávio Dino, na ADI 7697 MC/DF, traz importantes pontos a serem observados pelos municípios que implementaram as emendas impositivas em seu ordenamento jurídico, pois, o conceito de "Orçamento Impositivo" não deve ser confundido com "Orçamento Arbitrário".
O primeiro deles é o poder-dever irrenunciável do Executivo de examinar a validade desses gastos, avaliando se existe ou não impedimento de ordem técnica para execução, em especial a adequação da despesa com o processo orçamentário. Portanto, cabe ao Poder Executivo verificar se o plano de trabalho da emenda proposta pelo parlamentar está em conformidade com o Plano Plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Além disso, o relator destaca que os preceitos constitucionais devem ser observados quando da execução das emendas impositivas, em especial o princípio da eficiência, pois o dispêndio dos recursos orçamentários deve garantir que os bens e serviços decorrentes sejam usufruídos pelos cidadãos, nos termos do § 10 do artigo 165 da CF.
Aspectos referentes às limitações legais e de gestão fiscal, conforme a decisão, também precisam estar sob olhar atento do Executivo, de modo que a execução das emendas não comprometa o respeito às metas fiscais e aos limites de despesas e, não menos importante, as emendas impositivas devem seguir regras de transparência que permitam o controle social, desde a origem até a execução orçamentária e financeira.
Dessa forma, a prerrogativa parlamentar de propor emendas ao orçamento dos municípios, desde que respeitadas as balizas fixadas pelo TCESP e decisão do STF, ou seja, devidamente amparadas por regramento específico, perfiladas às peças de planejamento (aprovadas pelos próprios edis) e com a necessária transparência e monitoramento, muito mais do que uma suposta intromissão do vereador em papel antes ao executivo, pode se tornar um interessante instrumento de qualificação das ações e políticas públicas no âmbito municipal, contribuindo para melhor atender aos interesses e necessidades da comunidade.