ARTIGO

Do barquinho às conquistas: a superação de um fumante

Por Juliana Previtalli |
| Tempo de leitura: 3 min

O voo a Las Vegas, em 2017, na classe econômica, fazia conexão na Cidade do Panamá. Os ageiros deixaram a aeronave e deveriam aguardar algumas horas na área internacional, até iniciar o novo embarque. O saguão do aeroporto, de tão pequeno, permitia−os ver a rua e o movimento externo.

Fábio Ferreira de Moura, fumante de um maço de cigarros por dia, implorou, ao agente da polícia federal local, que o deixasse sair para fumar. Angustiado, desistiu, após reiterados “nãos”. Chegando a Las Vegas, fumou dois cigarros em seguida, acendendo um no outro.

Em 2021, fora nomeado Procurador do Município de Piracicaba, na gestão do prefeito Luciano Almeida, no auge da pandemia da Covid. Durante muitos dias, o lockdown, cujo decreto municipal fora elaborado e assinado por Fábio, previa que tudo permanecesse fechado — comércio, indústrias, restaurantes, postos de combustíveis — exceto farmácias e hospitais. O isolamento e o estresse aumentaram-lhe a dependência da nicotina: ou a fumar três maços por dia. Quando acabaram, rodou a cidade à procura de cigarros e só encontrava portas fechadas. Desesperado, descobriu, por um amigo guarda civil, um bar no bairro Novo Horizonte, aberto, e conseguiu comprar um daqueles “ranca-peito”, como dizem os fumantes dos cigarros muito fortes — a única opção.

A nicotina, segundo o site drauziovarella.uol.com.br, é droga de excreção rápida, tem meia-vida curta — duas horas em média —, ou seja, metade da dose fumada é eliminada da circulação em duas horas.

Algumas pessoas, por razões genéticas — os metabolizadores rápidos de nicotina —, eliminam a droga mais depressa e tendem a fumar dois ou três maços por dia. Os neurônios cerebrais, viciados em nicotina, lançam mão de sua mais poderosa arma de persuasão comportamental: a ansiedade crescente. Tomado pela vontade de fumar, o fumante perde a tranquilidade, torna-se agitado, nervoso e não se consegue concentrar em mais nada. Tais crises de fissura repetem-se muitas vezes por dia.

A convivência com o tabagismo começou desde a infância, nas férias na casa do avô, Júlio, em Anhembi, em meio às pescarias no rio Piracicaba, nos eios de lancha e nas Festividades do Divino, ao redor da capela de São Sebastião. Aprendera, com o avô, a beber cerveja e a fumar. De família antiga e tradicional, Fábio orgulha-se de Gonçalves Pinto, seu trisavô, que, em 1846, fora um dos pioneiros da Festa do Divino de Anhembi.

Estudou nos colégios Jorge Coury e Piracicabano e saía para fumar na Croco, na Mr. Dandy e nas festas de garagem. Cursou Direito na Unimep, seguindo os os do pai — o primeiro advogado da família e também professor daquela Universidade. Sempre às voltas com a política, lançara-se candidato a vereador aos 21 anos; fora coordenador de campanha; também, conselheiro e diretor no Clube Cristóvão Colombo durante 28 anos. Foi presidente da OAB Piracicaba — Ordem dos Advogados do Brasil — nos anos 2013 a 2015 — e  vice na gestão ada, até conseguir a reeleição e retornar ao  cargo de presidente, atualmente.

Os anos de tabagismo pesavam-lhe. Em 2022, não saía do hospital Unimed, devido à tosse constante.

Submetera-se a uma laringoscopia — procedimento endoscópico para visualizar a laringe, as cordas vocais e procurar a causa da tosse e da rouquidão. Assustou-se tanto, a ponto de decidir que pararia de fumar quando completasse cinquenta anos. Em fevereiro, comprara uma caminhonete Ford Ranger e, para conservar o cheirinho de carro novo, não fumava dentro dela. Assim, reduziu dois cigarros dos trinta que fumava por dia.

Iniciou o tratamento com bupropiona e adesivos de nicotina e, também, o orientei sobre comportamentos e hábitos. No dia 30/05/2022, durante a festa de aniversário flashback, no buffet, com todos os amigos, fumou os últimos cigarros. Desde então, melhorou-lhe o paladar, o fôlego e a disposição; sumiu-lhe o amarelado dos dedos e engordou alguns quilinhos. Vejo-o jogar beach tennis, ear com os cachorros no condomínio e, finalmente, consegui entrevistá-lo. Além de meu paciente, é meu vizinho.

Juliana Previtalli é médica cardiologista e atende em seu consultório particular.

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